Hans Christian Andersen foi um dinamarquês que gostava de contar estórias para grandes e pequenos. Todos conhecem a estória do Patinho Feio. Imagino que ele a inventou para consolar um menino feio, sem amigos, motivo de zombaria. Contou também a estória de uma menininha que, numa véspera de Natal, a neve caindo, tentava vender fósforos numa esquina da cidade. Ninguém parava. Ninguém comprava. Todos caminhavam apressados para suas casas onde havia uma lareira acesa, o vinho, a ceia e os presentes os esperavam. Todos queriam celebrar o nascimento de Jesus. É uma estória triste. De manhã a menininha estava morta na calçada, gelada pelo frio. É uma estória bem brasileira: não temos menininhas vendendo fósforos sob a neve que cai mas temos muitas crianças, adolescentes e velhos vendendo balas de goma nos semáforos. Eu também gosto de inventar estórias. E tenho prazer especial em re-contar estórias conhecidas dando-lhes um fim diferente.
Algumas das estórias de Hans Christian Andersen estão cheias de humor e ironia, como aquela do rei vaidoso que gostava de se vestir elegantemente. Vou recontar esta estória com dois finais: o dele e o meu.
“Havia um rei muito tolo que adorava roupas bonitas. Os tolos, geralmente, gostam de roupas bonitas. Pois esse rei enviava emissários por todo o país com a missão de comprar roupas diferentes. Era o melhor cliente da Daslu. Os seus guarda-roupas estavam entulhados com ternos, sapatos, gravatas de todas as cores e estilos. Eram tantas as suas roupas que ele estava muito triste porque seus emissários já não encontravam novidades.
Dois espertalhões ouviram falar do gosto do rei pelas roupas e viram nisso uma oportunidade de se enriquecerem às custas da vaidade da Majestade. A vaidade torna bobas as pessoas: elas passam a acreditar nos elogios dos bajuladores... Foi isso que aconteceu com um corvo vaidoso que estava pousado no galho de uma árvore com um queijo na boca: por acreditar nos elogios da raposa ficou sem queijo...
Pois os dois espertalhões-raposa foram até o palácio real e anunciaram-se na portaria, apresentando o seu cartão de visitas: “Doutor Severino e Doutor Valério, especialistas em tecidos mágicos.”
O rei já havia ouvido falar de tecidos de todos os tipos mas nunca ouvira falar de tecidos mágicos. Ficou curioso. Ordenou que os dois fossem trazidos à sua presença. Diante do rei fizeram uma profunda barretada, tirando seus chapéus.
“Falem-me sobre o tecido mágico”, ordenou o rei.
Um dos espertalhões, o mais loquaz, se pôs a falar.
“Majestade, diferente de todos os tecidos comuns, o tecido que nós tecemos é mágico porque somente as pessoas inteligentes podem vê-lo. Vestindo um terno feito com esse tecido Vossa Majestade será cercado apenas por pessoas inteligentes, pois somente elas o verão...”
O rei ficou encantado e imediatamente contratou os dois espertalhões, oferecendo-lhes um amplo aposento onde poderiam montar os seus teares e e tecer o tecido que só os inteligentes poderiam ver..
Passados alguns dias o rei mandou chamar o ministro da educação e ordenou-lhe que fosse examinar o tecido. O ministro dirigiu-se ao aposento onde os tecelões estavam trabalhando.
“Veja, excelência, a beleza do tecido”, disseram eles com a mãos estendidas. O ministro da educação não viu coisa alguma e entrou em pânico. “Meu Deus, eu não vejo o tecido, logo sou burro...” Resolveu, então, fazer de contas que era inteligente e começou a elogiar o tecido como sendo o mais belo que havia visto.
“Majestade”, relatou o minsitro da educação ao rei, “o tecido é incomparável, maravilhoso. De fato os tecelões são verdadeiras magos!” O rei ficou muito feliz.
Passados mais dois dias ele convocou o ministro da guerra e ordenou-lhe que examinasse o tecido. Aconteceu a mesma coisa. Ele não viu coisa alguma. “ Meu Deus”, ele disse, “ não sou inteligente. O ministro da educação viu e eu não estou vendo...” Resolveu adotar a mesma tática do ministro da educação e fez de contas que estava vendo. O rei ficou muito feliz com a seu relatório. E assim aconteceu com todos os outros ministros. Até que o rei resolveu pessoalmente ver o tecido maravilhoso. Mas, como os ministros, ele não viu coisa alguma porque nada havia para ser visto. Aí ele pensou: “Os ministros da educação, da guerra, das finanças, da cultura, das comunicações viram. São inteligentes. Mas eu não vejo nada! Sou burro. Não posso deixar que eles saibam da minha burrice porque pode ser que tal conhecimento venha a desestabilizar o meu governo...” O rei, então, entregou-se a elogios entusiasmados ao tecido que não havia.
O cerimonial do palácio determinou então que deveria haver uma grande festa para que todos vissem o rei em suas novas roupas. E todos ficaram sabendo que somente os inteligentes as veriam. A mídia, televisão e jornais, convidaram todos os cidadãos inteligentes a que comparecessem à solenidade.
No Dia da Pátria, a cidade engalanada, bandeiras por todos os lados, bandas de música, as ruas cheias, tocaram os clarins e ouviu-se uma voz pelos alto-falantes:
“Cidadãos do nosso país! Dentro de poucos instantes a sua inteligência será colocada à prova. O rei vai desfilar usando a roupa que só os inteligentes podem ver.”
Canhões dispararam uma salva de seis tiros. Ruflaram os tambores. Abriram-se os portões do palácio e o rei marchou vestido com a sua roupa nova.
Foi aquele oh! de espanto. Todos ficaram maravilhados. Como era linda a roupa do rei! Todos eram inteligentes.
No alto de uma árvore estava encarapitado um menino a quem não haviam explicado as propriedades mágicas da roupa do rei. Ele olhou, não viu roupa nenhuma, viu o rei pelado exibindo sua enorme barriga, suas nádegas murchas e vergonhas dependuradas. Ficou horrorizado e não se conteve. Deu um grito que a multidão inteira ouviu:
“O rei está pelado!”
Foi aquele espanto. Um silêncio profundo. E uma gargalhada mais ruidosa que a salva de artilharia. Todos gritavam enquanto riam: “ O rei está nu, o rei está nu...”
O rei tratou de tapar as vergonhas com as mãos e voltou correndo para dentro do palácio.
Quanto aos espertalhões, já estavam longe e haviam transferido os milhões que haviam ganho para um paraíso fiscal...”
Não foi bem assim que Hans Christian Andersen contou a estória. Eu introduzi uns floreados para torná-la mais atual. Agora vou contar a mesma estória com um fim diferente. Ela é em tudo igual à versão de Andersen, até o momento do grito do menino.
“O rei está pelado!
Foi aquele espanto. Um silêncio profundo. Seguido pelo grito enfurecido da multidão.
“Menino louco! Menino burro! Não vê a roupa nova do rei! Está querendo desestabilizar o governo! É um subversivo, a serviço das elites!”
Com estas palavras agarraram o menino, colocaram-no numa camisa de força e o internaram num manicômio.
Moral da estória: Em terra de cego quem tem um olho não é rei. É doido.
Depois que se percebe que o Rei está nú, algum posicionamento é necessário, neste momento as mascaras caem e fica notório o que vai dentro dos corações daqueles com as quais achamos que teríamos sonhos em comum.
Pode ser desconfortável e até frustrante, mas necessário.
Eu decidi, quero que o auto intitulado rei saiba, que nem esta "unção" ele tem, em algum momento uma pseudo epifania fez com que ele acreditassem que é o escolhido e que chegou sua hora de governar sobre os pobres incautos.
Suas roupas não lhe servem, não caem bem, por mais que ele tente vesti-las para fomentar sua auto-afirmação patética, quem tem discernimento vê que "o defunto era bem maior"
Você acredita que possui algo que a Graça não lhe deu. Acorda!!Sai do surto e volta para terra. Deixa de ser xarope!
Mano, a pior mentira é aquela que contamos para nos mesmos.
É claro que o pretenso rei tem plateia, pois até Sílvio Santos tem suas macacas de auditório, é simples entender que há aqueles que ficam confortáveis diante do fascismo dissimulado travestido de messianismo.
Entendo todos eles, mas não consigo mais deixar meu irmão em surto enquanto eu fico confortável, só há uma coisa a fazer, confrontá-lo com a verdade e a Verdade .
Diante da repercussão de sua ativismo compulsivo e suas manipulações infantilóides, só uma coisa a fazer.
Decidi, não quero caminhar junto.
A doida, que aprendeu que no Caminho a viagem mais importante é para dentro.
11 comentários:
Dri,
Tem hora que algo nos incomoda pra caramba (consciência) nos dizendo que a gente tem que se posicionar e pegar pesado.
Mandou bem!
Não sei pra quem, mas como eu não sou doida pego umas pitadas pra mim, pra não perder a lucidez.
Beijos,
Rê.
e quando o rei não está nu e todo mundo crê que ele está por que ninguém gosta da roupa?
Re,
eu já fiquei muito tempo da minha vida, esperando o "milagre" acontecer, descobri nesta altura da vida, que o "milagre" é pegar o banquinho e sair de fininho e quem quiser que brinque com o amigo imaginário.
abraços queridona
Dudu,
Até o reino só existe na cabeça do surtado.
Pior é quando o rei quer ser rei a força, custe o que custar.
Sei lá, mano, eu espero não sofrer deste tipo de doidera, e se acontecer, conto com a lucidez dos amigos.
Qualquer dia te conto a história decifrada.
abraços
Adriana, quando leio essa história e faço algumas vezes para meu filho, fico pensando no desconforto que cada um ali sentiu, mas reprimiu para não ser a voz dissonante. Gritar que o rei está nú,sem medo dos olhares só poderia ser iniciativa de uma alma franca, como a da criança e criança mal educada, pois que as que levam beliscões, perdem logo a naturalidade e a franqueza. Eu tb já fiz parte da platéia que aplaudia a roupa do rei, que gritava aleluia quando o rei dizia: "Algo tremendo vai acontecer aqui essa noite" e quando eu percebia que nada tinha acontecido, fazia igual aos outros súditos, achava que o problema era meu. Não me faltava inteligência, mas espiritualidade, fé, alguma coisa. O problema não era o rei e nem a roupa dele (se todo mundo dizia, era o que eu achava).
Mas um dia, eu virei criança mal educada e gritei : Esse rei tá pelado!! rs..
Bjs.. fica com Deus!
Concordo com a Re, tem horas que as coisas nos incomoda mesmo, mas as vezes não acreditamos no que enxergamos e queremos nos fazer de cegos, aí é que lasca tudo. Muito bom Dri. Paz!
Bom dia minha amada....
É com imenso prazer que leio este texto, fiquei algum tempo da minha vida vendo um rei nú sem dizer que ele estava nú, hj qdo percebo divido com quem posso e fico imensamente feliz de fazer parte desta revolução e deste grito " O REI ESTÁ NÚ ". Durante toda minha vida, dificilmente me calei quando não concordei, no minimo questionei, hj, com meu amadurecimento pessoal e espiritual posso até optar.... Que privilégio, Deus me toca de uma forma única, e se querem acreditar que o que faz sentido é a platéia, o pupito ( mesmo que camuflado) to fora.
Ainda bem que a nossa familha se entende bem.
Ainda bem que nasci da sua alma.
Te amo, como vc é, sem ilusões, e é tão bom amar alguem assim.
Estarei sempre aqui, enquanto fizer sentido ( pq sempre fará ).
Beijos
Oi Dri,
Li e reli seu texto. Entendo seu "grito".
Sabe o quanto já compartilhamos sobre esse assunto.
Desejo apenas que agora você esteja em paz.
Disse muito bem a querida Cristiane: estarei (estaremos) sempre por aqui porque faz todo sentido.
Beijos reverentes.
Su,
Agradeço por você suportar meus gritos.
Você tem sido ouvinte atenta e conselheira sábia.
Obrigada.
Oi Adriana! Sei de que “Rei” você fala e adorei seu texto inteligente, delicado, irônico de certa maneira, indireto para não perder a educação e sutileza, marcas de sua personalidade inigualável. Sensacional.
Gostaria de aproveitar o espaço que você me ofereceu tão gentilmente para dar um recado ao “Rei”.
Durante a graduação no curso de Pedagogia minha professora de Alfabetização nos trouxe um texto sensacional (não consigo me lembrar do autor), que nos apontava a importância dos aprendizados no jardim de infância. Conhecimentos mais importantes dos que os aprendidos na pós- graduação. Como por exemplo: Não ferir os coleguinhas, saber respeitar o limite do outro, compartilhar, dividir, respeitar as regras, saber ouvir, etc.
Pois bem, suposto e arrogante “Rei”, para ser rei, não é preciso imposição, força, falta de educação ou uso de estratégias sujas que inflam o ego de pessoas emocionalmente desequilibradas. Basta lembrar as regrinhas do jardim de infância. Pode acreditar, não tem erro. O senhor será respeitado e querido por todo e qualquer súdito.
Forte abraço em todos.
Luciana Fernandes.
Luciana,
Você é fogo na roupa, menina.
Sutileza e educação ficam por sua conta.
Na próxima encarnação eu venho como carro alegórico de escola de samba, eu creio rsrsrsrs
beijocas
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