Um tapinha não dói.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010




A edição 654 de 29 de novembro de 2010 da revista Época apresenta na sessão Dois Pontos a seguinte frase: “Se o filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um couro e muda o comportamento dele” (deputado federal Jair Bolsonaro do PP - RJ). Essa pérola foi dita por Bolsonaro durante um debate sobre o projeto de lei que proíbe a punição corporal em crianças e adolescentes (Lei da Palmada).

O projeto apresentado pelo Legislativo no fim do mês de julho de 2010 já causou muita polêmica e pretende estabelecer uma educação sem surras, tapinhas leves ou beliscões. Proposta que não precisaria ser apresentada caso o artigo 227 da Constituição Federal de 1988 fosse conhecido e bem interpretado por todos, afinal a redação deste trecho de nossa Constituição diz que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."

Diante de dados alarmantes que envolvem a exploração sexual de menores, os espancamentos e cárcere privado, me soa prepotente e irônica a intenção do governo em aprovar uma Lei que considere crime contra a criança e o adolescente o beliscão e a palmada no bumbum. O Estado não enxerga nem os casos graves que envolvem todo tipo de violência aos menores, conseguirá então bisbilhotar a vida de cada cidadão e suas famílias para identificar as crianças que levam ou não umas palmadas?

O principal argumento para a aprovação de tal projeto é a de que na maioria dos casos as pessoas não sabem diferenciar uma palmada de uma surra, um couro ou um espancamento. Será? Se o Estado consegue fazer essa diferenciação, por que não aplica com rigor a Lei já existente desde 1988 àqueles que andam livremente por nosso país agredindo covardemente nossas crianças.

Apesar de controvérsia a Lei da Palmada apresentada pela deputada Maria do Rosário (RS) não é nem de longe repugnante e absurda como a frase dita por nosso representante federal. Segundo Bolsonaro, um filho homossexual pode alterar seu comportamento depois de levar um couro.

Em que tempo se encontra nosso deputado? Por qual século esse indivíduo perambula? Quando foi que ele deixou de oferecer possibilidades ao seu cérebro de alterar suas idéias pré-concebidas e preconceituosas com informações relevantes, novas e repletas de descobertas recentes?

Freud, nascido em meados do século XIX defendia que o homossexualismo era proveniente de um atraso no desenvolvimento, causado pela super proteção da mãe ou ausência excessiva do pai. Já no século XX a Organização Mundial da Saúde se referia aos homossexuais como portadores de distúrbios mentais provocados por uma família desestruturada. Porém, caro deputado, estamos no século XXI.

Em junho de 2008 Stockolm Brain Institute, na Suécia, anunciou a conclusão de uma pesquisa que envolveu 90 voluntários submetidos a diversos exames de ressonância magnética que demonstraram o quanto o cérebro de um homossexual se assemelha ao de indivíduos do sexo oposto.

A sueca Ivanka Savic, coordenadora do estudo diz que homens homossexuais e mulheres heterossexuais apresentam a mesma facilidade para tarefas que envolvem concentração e bons resultados em testes que avaliam a capacidade de interpretação, facilidade com a linguagem e a escrita, características femininas encontradas em muitas regiões do mundo, o que segundo a pesquisadora descartaria a cultura como responsável pelo desenvolvimento dessas habilidades.

Seja qual for a explicação, cultural ou mera opção sexual de cada pessoa, o assunto deveria ser tratado com respeito e tolerância. Fiquemos com a explicação de Aristóteles "Não é por despudor que o fazem, mas por audácia, porque acolhem o que lhes é semelhante".

Passou do tempo de respeitarmos as diferenças e acolher o que nos parece estranho afinal, o mais importante mandamento deixado pelo maior Mestre que a humanidade já conheceu nos dizia que devemos amar nosso próximo como a nós mesmos.

Luciana Fernandes.

5 comentários:

Anônimo disse...

Maninha, isso aqui é lindo demais, amei muitooooooo, passarei por aqui muito tempo bebendo..rsrrss
Você muito linda!Beijos!

Pelo Vínculo do Calvário...
Shalom

Eduardo Medeiros disse...

Luciana, muito lúcido o seu texto. muito bem observado que a questão já é tratada na constituição.

bolsonaro é um fóssil da direita militar autoritária, um resquício da moral cristã opressora de direita. não é o único como bem sabemos.

eu até posso entender a boa intenção da nobre deputada ao propor o projeto mas dizer por lei como os pais devem criar os seus filhos é intromissão demais visto que os casos de violência já estão apontados na lei maior.

sou contra se bater em crianças. meu filho vai nascer este mês e espero nunca precisar dar-lhe palmadas; vou investir em sua educação (nos termos mais amplos dessa palavra), no ensino ao respeito aos mais velhos, passar para ele a imagem de amigo mas também de autoridade.

infelizmente muitos pais tomados por raiva e muitas vezes desequilibrados vão além das palmadinhas e acabam machucando esses pequeninos que não merecem tal sofrimento.

abraços

Wendel Bernardes disse...

A violência a que nossas crianças são acometidas vão muito além das palmadas, surras, violências sexuais, verbais e maus tratos fisicos com coação.

Nossas crianças são diariamente expostas a conteúdos insossos nos meios de divulgação como TV, Web...
São violentadas não só em seus corpinhos, mas também em suas mentes em desenvolvimento.


Nossa é a culpa, pois simplesmente nos abstemos de falar aquilo que devemos na hora que podemos fazer...
Seja com beliscões, palmadas, conversas...

Acho que já se invade DEMAIS a vida das famílias brasileiras. Ainda que travestidas de uma 'boa intenção', leis que limitam a educação que pais podem ter, mesmo com palmadas (e não surras, digo)uma conotação muito negativa (de fato) no seio familiar!

Ótimo texto Adriana!
Jé tenho algumas postagens sobre violência infantil e devo postar daqui uns dias outra sobre um assunto muito parecido com esse...

Grande abraço e ótimo final de semana!

Rô Moreira disse...

Eu acho que esta lei só atrapalha os pais que querem educar seus filhos, ou seja, só prejudica os pais que amam seus filhos e se preocupam, tem que saber separar palmadas de espacamentos. Não da pra colocar todos dentro de um mesmo saco, e porque um pai dar um tapa em seu filho para corrigi-lo será punido como se espancasse seu filho. Isso é cruel com quem realmente quer educar.
Se vc corrigir logo baterá o conselho tutelar em sua porta para retira de ti seu filho, isso é só pra destruir quem realmente se preocupa e ama os filhos. Paz!

Regina Farias disse...

Essa lei é pura pretensão e pretensão é tolice. Ora, como o Estado poderá "dar conta" de todos os pais que educam seus filhos? Por outro lado, é claro que existe um tipo de pai agressivo - e mãe (sem falar nos completos desajustados) e que deve ser enquadrado na lei, que inclusive já existe e é completa. A questão é a aplicação, como bem diz o texto.

bj

 

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