EXORCIZANDO AS TREVAS INTERIORES
Paulo disse, escrevendo aos
Efésios, que “tudo o que se manifesta é luz”.
Ora, esta afirmação carrega
um bem psicológico e espiritual incomparável.
Digo isto porque deixar que
o interior se expresse a nós mesmos, é o que de melhor podemos fazer por nossas
vidas.
Alguém pergunta: por que?
Ora, esta pergunta é mais
que pertinente, e isto por algumas razões bem simples de
entender.
Primeiramente porque somos
ensinados a esconder, a não deixar que nada se manifesta, visto que é nossa
tarefa, como “bons cristãos”, darmos “bom testemunho” mediante um comportamento
equilibrado, mesmo que o interior seja mais agitado e revolto que a força do
Atlântico quando empurra o Rio Amazonas de volta para seu próprio lugar, depois
que as poderosas correntes do rio invadem o oceano.
A segunda razão para não
deixarmos que nosso interior se manifeste vem da certeza que se tem do “juízo
dos outros” contra o que existe em nós—e que é a mesma coisa que existe em
todos—; e, por isto, selamos com selos de medo e vergonha quem somos e o que
sentimos, a fim de não sermos condenados pelos outros.
O que as pessoas parecem não
saber ou crer, é que Jesus disse que aquilo que acontece no interior da casa um
dia será gritado da varanda, pois, nada há oculto senão para ser
revelado.
Ora, este princípio é inviolável!
E por que tal princípio é
inviolável?
Primeiro porque o interior é vivo e dinâmico e jamais
para de crescer.
Ou seja: se algo existe em mim, no meu interior, esse
algo continuará a crescer até que venha para o lado de fora, para a luz. Assim,
quanto mais eu empurro para dentro aquilo que existe em mim como realidade, mais
eu aumento o poder do juízo no dia em que isto que está oculto vier a “gritar do
telhado” a fim de se expor como verdade.
Portanto, não há como eu
possa selar o meu inconsciente e fazer com que ele se cristalize em obediência
às minhas necessidades de conformidade exterior.
Mais cedo ou mais tarde o
que é, é...e passa a ser, mesmo contra a minha vontade.
Além disso, à semelhança do
Atlântico quando empurra o Rio Amazonas de volta para seu próprio lugar depois
que suas correntes invadem o mar, assim também o Inconsciente (Atlântico)
empurrará as repressões do consciente (o Rio Amazonas) de volta para seu próprio
curso, e força-lo-á a reconhecer a força que emerge do oceano de meu
Inconsciente.
Esta é a pororoca da alma, e os resultados podem ser
devastadores!
Ora, Paulo disse que uma vez que as coisas que estão
dentro—por mais feias que nos pareçam—emergem e aparecem como sinais exteriores,
seja pela via do comportamento ou apenas pela via da constatação dos sentimentos
e pulsões interiores que em mim existem, então, elas começam a perder a sua
força, visto que foram retiradas do ambiente no qual eles se alimentam—as
sombras do inconsciente! O caminho para a libertação das trevas é trazê-las para
a luz. Ora, a luz é a verdade.
Ou seja: o que nos liberta dessas forças compulsivas do
interior é a exposição delas à luz da verdade em minha
consciência.
Quando eu não me escondo mais de mim mesmo, e chamo pelo
nome aquilo que em mim existe e que eu passo a vida tentando negar a existência,
então, estranhamente, aquilo que passa a ser nomeado em mim, perde sua força,
visto que sua fonte de energia é a escuridade da negação, e o ambiente do
ocultamento culpado.
No entanto, quando abraçamos a verdade, essas sombras são
iluminadas pela luz em razão de meu ato de reconhecimento e de não-negação da
realidade em mim existente, e, paradoxalmente, perdem seu poder de assombrar,
pois agora já não são mais “fantasmas”, mas realidades nomeadas pela
luz.
A maioria das pessoas teme tal constatação pelo simples
fato de que foram ensinadas que tais coisas precisam ser reprimidas e matadas
por nós mesmos e em nós mesmos.
E, assim e desse modo, na tentativa auto-justificada de
ser santo, eu me torno um tarado, ou um ser compulsivo e cheio de amargura e
ódio, visto que nenhuma vida pode receber paz se existe em fuga de sua próprio
interior.
Trazer nosso interior à luz não deve ser entendido como
trazer nossa estultícia à luz.
Não, não é isto. De fato, o significado de “manifestar” o
interior não tem que significar um mergulho de cabeça no mar das nossas
compulsões e desejos reprimidos.
Ao contrário. De fato, tem-se que “manifestar” o interior
justamente para que ele não se torne nosso “senhor” e nos obrigue, sem escolha,
a expor pela pior via o nosso interior como doença do comportamento, e que pode
fazer mal não apenas a nós mesmos, mas há muitas outras pessoas.
Trazer nosso interior à luz
começa como vontade de não mais fugir de olhar para nós mesmos, e continua
mediante a coragem de dar nome às coisas que até então nós chamamos de “nossas
virtudes”.
Isto porque, em geral, quando o ser, como um todo, não
veio para a luz sem medo, a tentativa da gente é “batizar” nossas doenças com
nomes de santidade e virtude. Nesse caso, se alguém desejar saber quais são as
suas piores sombras e monstros ocultos no seu ser, basta ver quais são os temas
que mais o provocam como raiva e ódio em relação ao comportamento dos outros,
visto que, normalmente, odiamos de todo o coração aquilo que mais desejamos, e
não fazemos porque nos sentimos impedidos de realizar em razão de nossa própria
virtude exterior.
Assim, a virtude auto-glorificada é sempre o diagnóstico
da treva em nós ocultada!
O caminho, portanto, começa com o exercício de falarmos a
verdade com nós mesmos, e pararmos de julgar o próximo com ódio, pois quanto
mais negarmos que as mesmas coisas existem em nós, mais odiaremos aqueles nos
quais tais coisas se manifestam, e, assim, tanto mais, pela via de nosso próprio
ódio, aumentaremos nossa própria escuridade interior, e nossas sombras crescerão
sem limites em nós.
Pense nisto!
Caio
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1 comentários:
Menina do céu!
Que divã de psicanálise é esse?!!!
O que eu acho incrível nesse homem é que não há mesmice em seus escritos ainda que seja o mesmíssimo tema. Ele sempre surpreende, sempre ensina, sempre nos leva à reflexão. E o que é mais importante: nos empurra para fora de nós mesmos.
Enfim, não é para todo mundo. Só para quem quer rsss
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